A SOLIDÃO EM TEMPOS DE TINDER - UMA VISÃO OBSCURA DAS RELAÇÕES MODERNAS



Na era da rapidez de informação, os relacionamentos amorosos tiveram uma desconstrução do seu conceito de processamento de vínculos, e passaram a se tornar amores líquidos, onde o desenvolvimento da relação passa a ser afrouxada pelos envolvidos, afim de uma constante troca de parceiros e experiências. Passamos por inúmeros rostos todos os dias. Acumulamos várias energias ao nosso redor. Encontramos e desencontramos de possíveis predestinações de alma. Isolamo-nos na solidão de quartos sistematizados com nossos gostos, e nossas caras para fugir do real. E por fim, adentramos em um mundo onde as escolhas de relações, são definidas por arrastamentos mecânicos para a direita e esquerda.  

Esse processo de renovação do que é o amor, e nossas relações afetivas, mudou e remodelou a maneira como as pessoas conectam-se umas as outras. Não posso trazer a falsidade que os problemas de isolamento em uma sociedade aglomerada de pessoas começaram com o Tinder. É até sínico da minha parte sequer imaginar algo assim, sabendo que isso iniciou em meados dos anos 2008/2009 com o bate papo da Uol. O aplicativo apenas consolidou uma era onde buscar parceiros para namoro ou relações intimas na internet, é mais viável do que conhecer alguém no 6D.

A intenção inicial dos criadores de aplicativos para busca de relacionamentos, não é ruim. Vemos isso pela fala do CEO do Tinder, por exemplo:

“Uma parte expressiva dos indivíduos não consegue ter uma boa noção a respeito de quando alguém está, efetivamente, interessado nelas e, desta forma, o aplicativo "resolve", de maneira rápida e prática, o impasse situacional”. – Sean Rad CEO do TINDER.

“Então Carol, se ele veio para facilitar as pessoas que tem dificuldade em se relacionar com outras, ou saber se tem alguém interessado nelas, qual a parte ruim dessa evolução?”

Algo que martela na minha cabeça desde o inicio dessas relações virtuais, é que assim como um remédio, o amor, ou sua busca constante por ele em excesso, torna-se um veneno em cabeças inexperientes. Acredite, não minto.

Sigmund Freud em sua obra, Mal-estar na Civilização, nos traz que o amor, é “a forma do homem de atender ao princípio do prazer”, ou seja, é uma das maneiras que este tem de encontrar a felicidade. Assim na sua ausência, o individuo torna-se desamparado, frágil e suscetível as neuroses de estima baixa. Aqui chegamos ao ponto em que gosto de trazer o lado obscuro, quase não visto por usuários e adeptos a meios como este.

A expectativa exagerada dessa busca é um dos maiores passos antes do desenvolvimento de uma ansiedade. Isso se torna notável, já que o individuo nunca está tão indefeso contra o sofrimento, quanto ao fato de estar amando; e nunca se encontra tão desamparadamente infeliz do que quando perde seu objeto de amor ou não é correspondido. Afogamos-nos em esperas de “matches”, e morremos ao tê-lo e não ser chamado ao dialogo.

Passamos a ver como nosso senso e percepção sobre uma pessoa, torna-se limitado e superficial. A ideia central do mesmo é a grande “variedade do cardápio” (como ouvimos de alguns usuários), então nos sentimos livres para ignorar uma grande maioria apenas pela sua aparência. Isso corta um pouco a empatia pelo que os outros são, nos tornando pessoas frias e levados pela massa, por outro grupo de pessoas na mesma categoria, que aceitam ser tratados como “produtos no catalogo”.

Exemplos reais de tais experiências foram vivenciados em dois meses, quase três, de uso do aplicativo por minha parte, e de uma colega de classe. Eu utilizei meus dados reais para conhecer e entender as buscas dos usuários; e a mencionada, utilizou um perfil falso de homem, para entender a mente das usuárias.


Em resumo das nossas experiências, pude concluir que por parte do público masculino do aplicativo, uma parcela significativa deles desacredita na possibilidade de um relacionamento surgir e se consolidar por esses meios, focando apenas nas buscas de parceiras sexuais. Outra parte, classificada como minoria, já desejam encontrar além de parceiras, relacionamentos sérios. Esse ultimo grupo, possuía duas características em comum, para a possível falha nas relações sociais: timidez excessiva, ou imaturidade quanto a idade apresentada.

 O publico feminino do aplicativo, já foi dividido em três grupos, com o primeiro a trazer uma ideia mais profunda de interesse ali dentro. Algumas das mulheres com quem minha colega conversou, buscava um real interesse romântico, ou conhecer pessoas que estivessem na “mesma vibe” que a deles, de tentarem ao menos se conhecerem. O segundo grupo, dizia ter ciência que os homens sabiam e diziam que aquele é um aplicativo para que “arrumem sexo fácil”, e ainda assim compactuavam com a ideia. E por fim, o ultimo grupo de meninas, relatou que o aplicativo não foi uma boa experiência, e não recomendariam para amigas curiosas, por ser como estar em um palheiro, em busca de uma agulha semi-invisível.

Ao final da experiência, eu particularmente achei o tempo que passei ali metade engraçado e metade frustrante. Vi alguns amigos que jamais pensei que estariam ali, pessoas buscando realizar seus diversos fetiches e até homens casados em busca de apenas diversão. Caras interessantes a conversar realmente, apenas dois ou três no máximo.

Por fim, percebe-se às mudanças na forma de se dar dos relacionamentos na contemporaneidade, e que em alguns aspectos, há uma notável diferenciação em relação a nosso passado recente. Estamos nos tornando rasos demais. A forma simples e a superficialidade nos confirmam uma disposição de comportamento quando se trata de paquera virtual, além da facilidade do ir e vir, criar conta e apagar, sem dar nenhuma satisfação, fortifica a ideia da instabilidade de vínculos.

Não fizemos toda essa pesquisa para no fim generalizar que toda relação que ocorre ali dentro, é de sumo horror. Não mesmo! Conheço casais que se conheceram pelo aplicativo, e hoje namoram lindamente há tempos. Apenas queremos mostrar que as grandes expectativas de encontrar sua alma gêmea ali, deve ser tratada como um cacto: com muito cuidado, pois nem sempre sabemos quando nos descuidaremos e os espinhos nos machucarão. Traga a cautela como sua aliada no amor, por que como diz o grande Carl Gustav Jung:

 O amor tem mais do que um ponto em comum com a convicção religiosa: exige uma aceitação incondicional e uma entrega total”.



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